- Onde você vai quando está triste?
Ela quis dizer novamente a mesma coisa, que ia
para os braços dele, mas ele não estava ali agora. E para onde ela iria?
Havia apenas um não-lugar que outros escritores já
tinham descrito, e todos os lugares do mundo que em nada alteravam o seu
estado, seu humor ou ainda o seu sorriso triste de Monalisa arrependida.
Sentou-se na pedra mais alta e o balanço do mar
trouxe uma paz gostosa, as coisas iam e vinham-se mesmo, que aceitasse o
movimento insano do mundo, tão diferente dos ciclos de rotação e transação que
tinha aprendido na escola. Nem dava pra saber se aquilo era mesmo um ciclo ou
uma reta ou outra forma geométrica, ela tinha fugido dessas aulas também para
estar lá nos braços dele.
Na distração ela descobriu um bom lugar, um
lugarzinho bem dentro de si, lá no escondido da memória onde ela conservava a
pureza dos dias da infância e dos dias com ele, não tão infantis.
Quando caiu a primeira lágrima a tristeza começou
a se dissolver, seria esse o remédio?
Chorando ela adentrou na própria história e cavou
o mais rápido possível em busca de mais indícios da presença boa e reconfortante
dele. Achou.
E o choro ganhou proporções devastadoras e mais
tarde, bem mais tarde, ela entenderia que o lugar para onde ela ia quando
estava triste era tão dela, tão dentro dela, que até nele ela o encontrava. Não
era para os braços dele que ela ia sempre, era para dentro dela, ali naquele
abraço tão bom com cheiro de chuva começando a cair em tarde de muito Sol.
E só mais tarde, quando entendesse que a causa e o
remédio de tudo estava lá guardado bem debaixo do seu nariz, no peito de
batidas inconstantes, ela poderia voltar para os braços antigos dele, e dizer
sorrindo que ele não a fazia triste, nem feliz, nem nada.
Ele não a fazia, simplesmente.
Ela se fazia sozinha e com ele, se dividia, se
completava, mas inteira.
Porque ela tinha finalmente compreendido a ideia
boba de que para enxergar e aproveitar o mundo, as pessoas e tudo mais que ele
lhe oferecer, é preciso estar bem ali dentro, é preciso conhecer o pedacinho
que cabia somente a ela.
E talvez nunca mais
ela fosse triste, mas mesmo assim, ela voltaria ali sempre. Acredito que na
verdade, ela passaria a morar ali.
Definir é limitar. 'Se fosse criatura
que se exprime diria: o mundo é fora de mim e eu sou fora do mundo.'
(Clarice Lispector)
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